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que ideia tenho eu das cousas?
que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
que tenho eu meditado sobre deus e a alma e sobre a criação do mundo? não sei.
para mim pensar nisso é fechar os olhos e não pensar.
é correr as cortinas da minha janela (mas ela não tem cortinas). o mistério das cousas? sei lá o que é mistério!
o único mistério é haver quem pense no mistério. quem está ao sol e fecha os olhos, começa a não saber o que é o sol e a pensar muitas cousas cheias de calor. mas abre os olhos e vê o sol, e já não pode pensar em nada.
porque a luz do sol vale mais que os pensamentos de todos os filósofos e de todos os poetas. a luz do sol não sabe o que faz e por isso não erra e é comum e boa.
se deus é as flores e as árvores e os montes e sol e o luar, então acredito nele, então acredito nele a toda a hora, e a minha vida é toda uma oração e uma missa e uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
mas se deus é as árvores e as flores e os montes e o luar e o sol, para que lhe chamo eu deus?
chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
porque, se ele se fez, para eu o ver,
sol e luar e flores e árvores e montes,
se ele me aparece como sendo árvores e montes
e luar e sol e flores, é que ele quer que eu o conheça
como árvores e montes e flores e luar e sol.
e por isso eu obedeço-lhe,
(que mais sei eu de deus que deus de si próprio?),
obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
como quem abre os olhos e vê,
e chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
e amo-o sem pensar nele,
e penso-o vendo e ouvindo,
e ando com ele a toda a hora.
"o guardador de rebanhos"
alberto caeiro
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